Na semana que passou, o candidato Cavaco desperdiçou uma bela oportunidade para não alardear o estilo viscoso e rasteiro do seu eleitoralismo. Como um abutre salivando por carniça, despejou no «twitter» resumo do que extraiu do debate parlamentar sobre o Orçamento: «Vejo com muita apreensão o desprestígio da classe política e a impaciência com que os cidadãos assistem a alguns debates.»
Com uma só bicada, ensacou por junto todos os partidos e deputados que intervieram no debate, quando, em rigor só lhe seria legítimo verberar os que ele, Cavaco, tanto se esforçou por amigar: o PS/Governo e o PSD/Belém. CDS, PCP, Bloco de Esquerda e Verdes produziram intervenções dignas e pensadas, chegando mesmo a reprovar o desmando argumentativo do Arrufo Central. Mereciam ser excepcionados e louvados pelo dito magistrado de influência, mas como o pensamento deste voa tão alto como um crocodilo, lá ficaram na roda de serem todos iguais. Só ele, o apreensivo, não.
Ele, que tanto prestigiou a política envolvendo-se na mais velhaca urdidura que jamais um Presidente se tinha permitido, ao fazer soprar suspeitas de escutas do Governo sobre Belém, e isto DEZASSEIS meses antes de ter ocorrido o episódio do Estatuto dos Açores, que os sabujanalistas do costume dizem ter sido o momento da ruptura com Sócrates, o único vilão.
Ele, que tanto prestigiou Portugal quando o ferrabrás de Praga, Vaclav Klaus, fez estentórica chacota da gestão lusa do défice e Cavaco só encontrou, para resposta, uma saída de poltrão: que não tinha responsabilidades governativas.
Ele, que se gabou de nunca ter sido tão lesto a promulgar como na nacionalização do BPN - e nunca saberemos se o fez por um tremendo imperativo nacional ou se pela térrea preocupação de pôr a salvo cabedais que ali deixara a levedar.
Ele, que recomenda que se explique ao povo os sacrifícios que lhe são pedidos mas que nunca teve a lembrança de dar uma aula prática de fidalguia e recusar a pilha de reformas com que se aboleta, desprezando o exemplo de Ramalho Eanes. Veremos se, agora que se diz que vai haver lei sobre a matéria, a promulgará tão asinha e alegremente como o fez com a outra...
A rasteira maior foi ter usado o «twitter», uma rede social muito frequentada por jovens, possivelmente os mais carentes de exemplo cívico e de sentido para o seu futuro colectivo, que escusavam de saber que o candidato Cavaco não tem mais filosofia do que um avinagrado motorista de táxi: «São todos iguais.»
5 comentários:
Pois é, os aníbeis, os loureiros, os BPN, mas se fosse só isso, se fossem nomes, o presidente da França, da Alemanha, de Itália, se fosse só isso.
A coisa fia mais fino: trata-se da Europa, do Euro, da coesão.
Por que julgas que vieram os chineses?
Só s chineses e os árabes defendem o euro, para fazer face ao dólar, de novo por causa das fontes energéticas.
Vamos ver como vai correr a cimeira da Nato.
Ainda vamos presenciar a revisão do Tratado de Lisboa. Para melhor? Não, para pior.
Eu, por mim, apoio o Alegre, como sempre apoiei. Com fé? Sem nenhuma.
Ah, se fosse só isso!
Um excelente título.
Gostei deste artigo. E para "variar", li há dias que as intenções de voto dos portugueses dariam uma vitória ao PSD, novamente. E este Aníbal (oxalá me engane) está de peito feito para ocupar, novamente, o poleiro. Afinal, este país continua a revelar falta de imaginação e de criatividade; uma espécie de "vira o disco e toca o mesmo" e daqui não passamos. Apetecia-me escrever uma expressão imprópria para consumo mas não escrevo because i'm a lady. Mas... que apetece dizer umas coisas feias, lá isso apetece.
Continuação de bom Domingo
Clara, se achas que os manuéis são melhores que os aníbais, acho que é uma pena que não tenhas fé...
Bjinho
AR, obrigado
relogio.de.corda, obrigado pela atenção. Diga coisas feias, mesmo ao domingo. Há momentos que só assim se aliviam.
Paulo:
Perguntas por que não tenho fé?
Porque está tudo minado pela crise económica e os manéis não conseguem, ou não podem mudar nada.
É apenas uma questão de honra.
Beijinho.
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