"Às oito da manhã, o padre Duncan, o padre Heriberto e o padre Luis começam a insuflar o templo, isto é, estão na orla de um rio ou numa clareira na selva ou numa aldeia qualquer quanto mais tropical melhor e, com a ajuda da bomba instalada no camião, começam a insuflar o templo enquanto os índios das redondezas os contemplam de longe e um pouco estupefactos porque o templo que a princípio era como uma bexiga esmagada começa a endireitar-se, arredondar-se, esponja-se, no alto aparecem as três janelinhas de plástico colorido que vêm a ser os vitrais do templo, e por fim salta uma cruz no ponto mais alto e já está, plop, hossana, soa a buzina do camião à falta de sino, os índios aproximam-se assombrados e respeitosos e o padre Duncan incita-os a entrar enquanto o padre Luis e o padre Heriberto os empurram para que não mudem de ideias, de maneira que a missa começa assim que o padre Heriberto instala a mesinha do altar e dois ou três adornos com muitas cores que portanto têm de ser extremamente santos, e o padre Duncan canta um cântico que os índios acham extremamente parecido com os balidos das suas cabras quando um puma anda perto, e tudo isto acontece numa atmosfera extremamente mística e uma nuvem de mosquitos atraídos pela novidade do templo, e dura até um indiozinho que se aborrece começar a brincar com a parede do templo, isto é crava-lhe um ferro apenas para ver como é aquilo que se insufla e obtém exactamente o contrário, o templo desinsufla precipitadamente e na confusão todo o mundo se atropela à procura da saída e o templo envolve-os, esmaga-os, abriga-os sem lhes fazer mal algum claro mas criando uma confusão nada propícia à doutrina, principalmente quando os índios têm ampla ocasião de ouvir a chuva de coños e caralhos que os padres Heriberto e Luis distribuem enquanto se debatem debaixo do templo à procura da saída".
Julio Cortazar, Papéis Inesperados, Ed. Cavalo de Ferro, 2010
Pintura: Antonio Berni
1 comentário:
Keila, olá. Cortazar, como ninguém para contar uma estória...
Bj
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