16 outubro 2009

... chacun pour soi...

Um emigrante português morreu, há dois anos, na sua casa, nos arredores de Paris. Mas só na passada segunda-feira, 12 de Outubro, foi encontrado.
Sentado num cadeirão e "literalmente mumificado”. Foi assim que os bombeiros encontraram o homem, de 62 anos, morto desde 2007, num apartamento dos arredores de Paris, para onde emigrara. Apesar do cheiro do corpo em decomposição, ninguém (ali) deu pela sua morte. A identificação do corpo foi possível pelo número de série da prótese auditiva.
José Macedo, parece que tinha 4 irmãos (quatro), 4 filhos (quatro), vários sobrinhos e ex-mulher (com quem continuava legalmente casado). Parece que no frigorífico havia iogurtes de 2007.
Dois anos, mais de setecentos dias.
Noite, dia, natais, páscoas e aniversários....
Um vizinho, interrogado por um jornalista, diz que, aos poucos, se foram habituando ao cheiro e, de toute façon, ici, c'est chacun pour soi...

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6 comentários:

CNS disse...

A indiferença é par necessário da solidão.

A disse...

Isto tira qualquer pessoa, com um pingo de humanismo, do sério.
Que cambada de família é esta?!?
O vizinho foi-se habituando ao cheiro?!?
Razão teve o Beckett quando insistiu que «habit his a great deadner»: há pessoas que antes de morrerem já estão mortas.
Abraço.

mtt disse...

Não sou, por natureza, uma pessoal muito dada a radicalismos. Portanto, detesto fazer julgamentos e pugno pelo direito à presunção de inocência.
Isto aplica-se ao que vou dizer a seguir que são meras reflexões que quero partilhar. Só isso.
1-há famílias que, entre elas, não se ententem;
2- há pessoas que tendo família, não a têm;
3- há pessoas da minha família que, para mim, são perfeitos desconhecidos e tenho mais afinidades com os meus vizinhos do que com eles e nada, mas mesmo nada, me obriga a gostar de estranhos;
4- há pessoas cujo dia-a-dia é uma verdadeira batalha pela sobrevivência;
5- há pessoas que não gostam de ninguém a não ser de si próprios e da sua própria companhia e tudo o resto lhes é perfeitamente marginal e sem valor; e isso, mais cedo ou mais tarde, é-lhes fatal;
6 - há pais e filhos por mero acaso;
7- será que este homem sofreu alguma vez de solidão?
8- Porque razão, se é que isso aconteceu, terá caído no esquecimento dos que lhe eram mais próximos?

JOSÉ RIBEIRO MARTO disse...

Esta notícia é arrepiante !
Chacun pour soi , mas eu fico a pensar e com as reflexões da marteodora .
abraço
_______ JRMARTO

C. disse...

Não quero acreditar, mas é bem possível que o povo tenha razão quando diz que "cá se fazem, cá se pagam". Não sei que tipo de laços criou este homem, ao longo da vida, de forma a que os outros tivessem dele uma diária lembrança afectuosa, e por ele uma quotidiana preocupação. Se calhar, nunca falava aos vizinhos, não se dava bem com a família, era bizarro e obtuso. Até podia ser um escroque. Tudo pode ser.
Além disso, os pagamentos mensais continuavam a efectuar-se por débitos directos, o que não levantou suspeitas sobre o desaparecimento do homem.

MAS... o que mais estranho é que, passados quinze dias que fossem, o cheiro da putrefacção não tivesse levantado EM NINGUÉM a suspeita de poder estar ali ALGUÉM morto.
Fosse um bom ou mau homem. Fosse o que fosse. Estava morto. Precisava que o enterrassem.

E essa indiferença do "chacun pour soi" reflecte um constructo do homem social. É isso que me entristece.

Ana Paula Sena disse...

Soube da notícia. Para mim, é uma história de terror demasiado real. O que assusta é a indiferença dos que o rodeavam, presos nas suas vidas, provavelmente também elas desligadas de toda a réstia de humanidade.