01 maio 2009

Formiga nadadora


*
Fala a preguiça


Eu gosto tanto, tanto ,tanto
de estar quieta, muito parada,
de fazer nada, coisa nenhuma,
e de fazer isso, que é não fazer
e de não estar, não ir, também.
Eu cá faço nada e todos
me dizem que faço isso muito bem.

Faço arroz de nada, pudim de nada
(que não é nada, está-se mesmo a ver)
e é tudo muito bom, delicioso,
só por não ser preciso fazer.
Eu faço nada, sou um nadador,
mas não daqueles que nadam mesmo,
O que é cansativo, tão maçador;
é que nadar, cá para mim,
tem um defeito insuportável:
aquele erre que está no fim .

E não digam que não faço nada
porque eu faço isso o mais que posso
e se não faço mais é porque mesmo nada
fazê-lo muito é uma maçada.
Não quero ir. Ainda é cedo.
Que pressa é essa? Não pode ser!
Deixem-me estar porque eu hoje tenho
bastante nada para fazer.

Álvaro Magalhães, O Brincador, Edições Asa, 2005

* Bill Evans - Quiet Now

3 comentários:

Paulo disse...

Mal chegue o tempo quente, começo a nadar no mar do nada (nem preciso de bóias...).
Que belo feriado!

Unknown disse...

contiuando a brincar com as palavras.

As mulheres curam-se da preguiça pelo amor;
pelo contrário,a preguiça nas mulheres cheias de vida é presságio de amor.
LA BRUYÈRE


É sempre dia de festa para o preguiçoso.
Provérbio Russo

Marta disse...

Grande Álvaro Magalhães! Gosto muito dos livros dele. E o brincador poema/prosa, uma delícia, como este!

E mais um dia de dolce far niente, em dia do trabalhador! Contradições...da vida :) Ou não!

beijinhos